4 de dez. de 2007 | By: @igorpensar

O TEMPO...


Por Igor Miguel


O tempo é uma abstração paradoxalmente apropriada pelo empirísmo, já dizia Kant.


O tempo é um pedaço da eternidade que nos foi legado, limitação do ilimitado, uma amostra de como é bom viver no tempo. Como é bom, existir e deixar as impressões de um tempo, em que sempre teremos tempo. Um tempo, no qual, as horas deixarão de passar.


A passagem não fará sentido. O que fazemos com o pouco tempo que temos? Temos que cuidar bem dele. Afinal, o que fizermos com o pouco tempo, será determinante para os dias em que tempo deixará de existir. Quando enfim, estaremos imersos na infinitude da vida.


O que é o tempo, se não marcas que deixamos para não sermos engolidos pela eternidade. Todos querem a eternidade, mas muitos a temem. Temos medo de sermos engolidos por ela. A eternidade não tem escoras e marcos, tem apenas homens, homens na suavidade de um tempo perdido.


Só temos um pouco mais de tempo, porque tememos perder o pouco que temos. Nos apropriamos do tempo com tamanha ambição, que perdemos a eternidade.


Eternidade, é um status, é admitir-se senhor do tempo, é assenhorar-se daquele que tentou nos escravizar. Eternidade é liberdade, é a possibilidade de que o tempo não tem mais nada para curar.


O tempo é uma abstração, tão relativa, que as vezes sente-se que o tempo passou rápido, outras vezes, que ele parou. Quem determina o tempo se não nós. O tempo é subjetivo! Não experimentamos os segundo do prazer, e a eternidade da dor, mesmo que aconteçam em milésimos? A norma não determina o tempo, nós o determinamos, porém ao invés disso nos tornamos seus servos. Sujeitos da história, que não se assenhoriam dele. Podemos resistí-lo, mas ele estará lá, tentando novamente se assenhorá de nossa vida, tentando nos confundir.


É conflitante pensar o tempo assim: hora senhor, hora servo. Hora destino, hora livre-arbítrio. Hora Calvino, hora Armínio. Quando a hora vai passar? É melhor parar por aqui, afinal não tenho mais tempo, ou é ele que não me tem mais?

25 de nov. de 2007 | By: @igorpensar
:: Pessoa, Indivíduo e Sujeito ::
Achei interessante postar aqui, uma atividade provocada por minha professora de didática, que incrivelmente nos introduzido ao mundo da síntese. Acho que este é uma exercício interessante. Tente você mesmo definir pessoa, indivíduo e sujeito. Alguns terão dificuldades, outros perceberão que buscamos algumas referências de ordem cultural para definir estas esferas. O legal, é que nos confrontamos quando fazemos uma reflexão como essa. Contribua você também colocando nos "comentários" seu ponto de vista sobre estes 3 conceitos. Deixo minhas próprias reflexões sobre o que significa cada um destes termos.

Pessoa
Refere-se à pessoalidade e a esfera ontológica. Diz respeito ao homem como ser relacional, visto por si e por outros. Integrado com o mundo, percebido por si e autoconsciente. Refere-se ao homem como ser inserido em uma malha de significados pessoais e de permuta de subjetividades (intersubjetividade), em contraste esta a impessoalidade, que refere-se a superficialidade e a artificialidade das relações humanas, o homem desprovido de existência, solitário. A impessoalidade pode ser ilustrada pelo filme Tempos Modernos de Chaplin, que ilustra as mazelas do homem moderno, sua angústia no deserto de homens, onde não está só por falta de pessoas, mas por falta de pessoalidade nas relações de trabalho e existência. A privação de pessoalidade, pode provocar uma vazio ontológico (existencial), uma angústia de ordem psicoemocional em que o sujeito questiona sua existência.

Indivíduo
Refere-se a personalidade, a singularidade do ser. O indivíduo, enquanto entidade única, a individualidade. Refere-se a identidade, aquilo que determina uma pessoa como "única" em relação aos outros. A individualidade está profundamente ligada a percepção de si, como ser construído historicamente (Marx), pelo discurso (Foucault) ou pelos efeitos do inconsciente (Freud), cada abordagem filosófica ou científica, determina a construção da identidade dentro sua abordagem, ou em cada tempo o zeitgaist que o determina. Em uma abordagem que combina a antropologia cultural e o pós-estruturalismo, o sujeito é produto dos diversos discursos, ou de sua relação (interativa) entre à malha simbólica (a dimensão cultural) e suas estruturas subjetivas (do indivíduo). O homem interpreta a realidade a partir dos diversos discursos, da palavra posta, das "verdades" produzidas e legitimadas, através de complexas relações de poder. O sujeito tem sua individualidade determinada pelas falas produzidas por outros e a partir de sua própria interpretação de si no mundo.
A individualidade diz respeito também, aquilo que me difere do outro, a diferença esta profundamente ligada a individualidade, seu oposto, a fragmentação da identidade, tem raízes na concentração demográfica, na ênfase na coletividade e na corporatividade na modernidade. Sendo assim, o desconforto inevitável, é sentir desprovido de individualidade e identidade. Principalmente, quando se cumpre uma diversidade de papéis na complexa estrutura cultural da modernidade.

Sujeito
Refere-se no racionalismo cartesiano ao res cogitas (ser pensante); no materialismo histórico refere-se ao sujeito que lida com o trabalho; no positivismo e no empirismo refere-se ao ser que captura e experimenta a realidade (objeto) a partir de suas experiências sensoriais. Na Gestalt é aquele sujeito que recebe as impressões da realidade e as percebe não por sua essência, mas por suas impressões. Na antropologia, no existencialismo e no pós-estruturalismo, refere-se ao intérprete, aquele que lê a realidade a partir de sua cosmovisão, de sua estrutura de valores e significados. O sujeito é sempre aquele que aborda, aquele que pensa, aquelo que prescruta e cogita sobre a realidade. Paulo Freire faz uma crítica relevante ao aspecto que o termo sujeito fala de alguém submetido, sujeito à realidade. Sua abordagem sob influência do materialismo histórico e do humanismo cristão, propõe um sujeito ativo, ou seja, agente da realidade, que intervém na história, e não é somente determinado por ela. De qualquer forma sujeito está ligado à binarismos do tipo sujeito-objeto, sujeito-realidade, sujeito-cultura, sujeito-estímulo e sujeito-mundo. Há elaborações ou desdobramentos destas relações, como sujeito-mediador-estímulo (Reuven Feuerstein - construtivismo sócio-interacionista) ou ainda, a relação sujeito-sujeito (relação dialógica ou intersubjetiva) como sugere o filósofo Martin Buber (que influenciou Paulo Freire e sua pedagogia do diálogo). De qualquer forma "sujeito" está sempre ligado àquele que pensa, interage, age ou recebe os efeitos da realidade. O termo sujeito está presente na epistemologia, e na elaborações sobre como se conhece a realidade (gnosiologia).
22 de out. de 2007 | By: @igorpensar


Tropa de Elite, o filme.

Falta de Ética, a realidade.


Por Igor Miguel


Assisti recentemente a película “Tropa de Elite”. Visto por milhões de expectadores, antes mesmo de sair em cartaz, trouxe um misto de revolta ao sistema de segurança pública e admiração ao chamado BOPE, o batalhão de operações especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro.


Porém, o quê me inquieta é a forma como alguns adolescentes e jovens vêem este filme. Eles se impressionam com a violência e com a crueldade, com que policiais tratam bandidos e consumidores de drogas. Estes meninos sabem o nome das armas; o funk e o rap que fazem parte da trilha sonora. Chegam até, a reproduzir o jargão policial-marginal e o palavreado da cultura carioca.


Porém, não conseguem perceber algumas sutilezas, como por exemplo, a discreta menção a um filósofo pós-estruturalista francês chamado, Michel Foucault. Sua obra chamada Vigiar e Punir, tem destaque, evidenciando que a intenção do filme não é demonstrar a “violência”, mas as relações de poder (Foucault), que permeiam macro-estruturas como a polícia, o tráfico, o governo e também, as micro-estruturas capilares envolvidas na corrupção. Estas últimas, caracterizam-se por complexas e invisíveis estruturas sociais como: pequenos gestos, ações individuais ou de pequenos grupos ou guetos, destacando os vulgos playboys ou “filhinhos de papai”, que nutrem a violência, quando sobem os morros para comprar uma “trouxinha” de maconha, e cometerem “pequenos” delitos.


Seria de um reducionismo ridículo, responsabilizar uma esfera da sociedade, ou grupos sociais restritos, por todo esta balbúrdia. A lógica da corrupção no Rio de Janeiro é sustentada por um tumor maligno independente, um parasita que se aproveita de instituições públicas para continuar existindo. Mas, será que a corrupção parte de cima para baixo ou de baixo para cima?


Na verdade, a banda podre do Rio é sustentada em parte, pela cultura e visão de mundo dos atores sociais envolvidos. Para uma análise apropriada, deve-se retomar o comportamento e os gestos dos indivíduos, para finalmente, compreender as ações institucionais, que refletem a ética social envolvida.


Estas evidências, podem ser percebidas em qualquer lugar do Brasil. A cidade do Rio de Janeiro é a imagem nua, do que acontece de forma velada em outras regiões do território nacional, como nas Minas Gerais da família Neves.


Mas o que me preocupa, como ouvi recentemente de um locutor, é a falta de ética do povo brasileiro em geral. Ninguém suporta a corrupção política de algumas instituições. O que mais se ouve são frases desprovidas de crítica, do tipo: “...é um absurdo!”.


Crítica, significa critério, é submeter o que vemos na realidade, no dia-dia, na mídia e nos jornais, ao discernimento e à análise. O brasileiro precisa sair da “reclamação” e migrar para a “crítica”. O problema, é que nós brasileiros, sofremos da “síndrome de privação cultural” (como diria o educador israelense Reuven Feuerstein), não temos repertório simbólico, para nos posicionarmos politicamente e intelectualmente ante as demandas sócio-históricas que enfrentamos. Eles pensam por nós! A mídia pensa por nós! Os intelectuais pensam por nós! No final das contas, não sabemos nem se pensamos. Em suma, somos chamados de burros e vivemos em um país que nos “burrifica”. A escola, a igreja, a família, todos contribuem um pouco para nossa completa alienação e o permanente discurso da incompetência.


Nosso país é híbrido. Adotamos um modelo capitalista manco de economia e consumo, mas desprezamos a ética que sustentou o capitalismo – onde ele funciona. Importamos, modelos europeus e americanos, mas não importamos a ética protestante (Weber), ética judaico-cristã.


Discursa-se sobre o mito da neutralidade científica, isto todo mundo já sabe. Mas, e o mito da neutralidade religiosa? Por que não é debatido? Não há conhecimento científico, direito ou política, desprovidos de pressupostos religiosos. Idéias como: soberania de estado, estado de direito, igualdade, conhecimento, ordem e progresso, bebem em fontes religiosas. Nem o caos pós-estruturalista (de um tempo desprovido de intencionalidade, tempo não-teleológico), é totalmente desprovido de algum princípio religioso. A própria negação da fé, segue um modelo dogmático.


Sendo assim, precisamos de ética, de princípios morais que norteiam nosso posicionamento no mundo. Somos corruptos, praticamos pequenos delitos, sempre queremos tirar vantagem em tudo, nunca pensamos de forma descentrada e no fim, tudo gira em torno de nossos interesses. Somos perversos, sustentamos uma mega-rede de corrupção, de mentira e anomia. Quando atravessamos uma rua fora da faixa de pedestre, transgredimos um sinal vermelho, damos um cheque sem fundo, mentimos naturalmente, pedimos nosso filho para dizer que “não estamos”, quando não devolvemos o troco a mais, quando cometemos pequenos furtos, quando não respeitamos o corpo das mulheres (digo como homem), quando as mulheres não se respeitam. Sustentamos uma lógica cruel, uma teia de iniqüidade, uma cultura da esperteza e da pilantragem.


O Brasil, precisa retomar a ética judaico-cristã, se reeducar nos valores, na hombridade, no respeito e na alteridade. O Brasil precisa ser mais sábio, sabedoria na cultura judaica (em hebraico chochmá) significa, habilidade técnica. Não é uma intelectualização estéril, mas um mecanismo de intervenção e comportamento, sob a égide de princípios. O Brasil perdeu os valores. O cristianismo evangélico-católico tem contribuído pouco neste aspecto. Não são poucos os calotes em nome de cristãos, que fazem de tudo por uma espiritualidade que é determinada pelo bem estar econômico e sustentado pela seguinte lógica: se, sou rico sou santo, então vale tudo para ser santo ou para ser rico.


A religião, que deveria ser a maior responsável pela ética, troca seu discurso, fazendo vista grossa para manter sua platéia de homens e mulheres destinados ao cativeiro cultural brasileiro.


O filho deste mutante antiético é o tráfico, o homicídio, o estupro, o furto; a corrupção dos agentes públicos, da polícia e das forças armadas; deu-se à luz a violência.


A violência é um fluxo, uma energia que se move. Violência, transforma-se em violência. Nenhum ato violento, se neutraliza, ele se transforma em outro ato de brutalidade. Responder com agressão a violência é a medida extrema que procura corrigir, aquilo que a educação, a religião e o estado, não deram conta. A violência é subproduto da falta de ética, da coerção social e de uma consciência coletiva (Durkheim) elaborada a partir da indestrutibilidade do pacto social.


Enfim, precisamos de uma tropa de elite, porque falhamos, porque não temos nenhum modelo que ponha limite aos nossos atos. Matamos nossos pais, Deus, professores, mestres e todos aqueles, que tentaram nos ensinar alguma coisa. Nos desvirtuamos e nos encontramos em um pesadelo perturbador. Só há um jeito de sair dele, acordando e retornando aos conselhos dos anciãos, a elite da terceira idade que lega valores, que insistimos desprezar.








12 de ago. de 2007 | By: @igorpensar

CRENDO PARA PENSAR, PENSAR PARA AGIR

Uma mensagem que precisa alcançar o homem integral.

Por Igor Miguel

Este pequeno texto é uma recente síntese de minhas reflexões sobre a verdadeira espiritualidade – parafraseando Francis Schaeffer.

Desde minha experiência de regeneração, em meus memoráveis 17 anos, até meus atuais 27 anos, permanece em minha consciência a clareza de que todo discípulo do Messias Jesus está em permanente estado de transformação espiritual e intelectual. Todos nós estamos em um processo de restituição do status quo de filhos de Deus, que inclui o chamado culto racional, uma ação dinâmica de Deus pela renovação de nossos conceitos e pensamentos.

Em dias de fundamentalismo irrestrito, minhas idéias pareciam sólidas em minha paradoxal e porosa ortodoxia. Não podia dizer que minha teologia era de autoria própria ou se afinal a recebi pronta. Um dia percebi que alguns dos pilares desta suposta solidez doutrinária estavam comprometidos, pois não eram colunas, mas estanques de madeira prestes a ruir. Senti-me obrigado a removê-los aos poucos e vi parte da estrutura que compunha minha visão de mundo comprometida por causa desta provisoriedade. Mas tudo isto fazia parte de uma grande obra de restauração orquestrada pela genialidade de Deus.

Seria impossível narrar, nesta pequena produção, todo o incrível processo que vivencio de crises e sínteses culturais e espirituais. Seria impossível narrar detalhes tão subjetivos, que talvez, e na maioria dos casos é assim, só fazem sentido para mim mesmo. Espero que ao menos faça algum sentido para aqueles que lerem este texto.

Depois de paradigmas quebrados e a elaboração de novas abordagens teológicas, gostaria de expor uma tríade que sintetiza minha presente visão de fé.

Crendo

Não resta dúvida de que o homem é um ser hermenêutico, voraz intérprete da realidade e leitor assíduo do mundo em que vive. Não há um homem sequer que não se sinta impelido a questionar e a dar significado aos fenômenos que o envolvem.

De alguma forma, todos elaboram um sistema de crenças, seja a partir de uma filosofia própria ou, quase sempre, por empréstimo para interpretar a realidade. Este sistema de crenças pode ser espontâneo, sistemático ou ordenado em uma tabela de credos. De qualquer forma, todos os homens percebem a realidade em que estão inseridos a partir de uma estrutura dogmática. Assim fazem teólogos, religiosos, filósofos, cientistas, leigos e ateus. Do senso comum ao conhecimento científico, respondendo ou negando (como faz o ceticismo) os fenômenos, é sempre impossível se deparar com o mundo sem apego a crenças.

Encontramos finalmente uma ligação interessante entre "crer” e "pensar". A fé, de alguma forma, está profundamente enraizada em algum tipo de racionalidade. Nenhuma estrutura racional é totalmente desprovida de fé e nenhuma estrutura pística (que se relaciona a fé) está à margem da racionalidade.

Porém, há duas vias comumente apresentadas para lidar com a elaboração de uma cosmovisão: Percebê-la como uma estrutura rígida e estável ou como uma estrutura móvel e dinâmica. Na primeira abordagem, em casos extremos, caracteriza-se pela mente dogmática, fechada, reducionista ou legalista. Geralmente o dogmático vê-se aprisionado a um modelo fixo de percepção da realidade, não havendo espaços para resignificação ou quebra de paradigmas. Na segunda, também nos casos mais radicais, há o ultraliberal ou relativista, que descarta quaisquer referenciais teóricos, qualquer certeza. Tudo é questionável e anômico; e os conceitos são flexibilizados conforme a demanda da realidade. Geralmente pensa-se que não há alternativa, que estaremos eternamente aprisionados ao binarismo dogmatismo-relativismo.

Porém, permitam-nos a lógica do terceiro excluído. Pensemos em uma terceira via, em que nossa visão de mundo não é sustentada nem pelo dogmatismo e nem pelo relativismo. Ilustraremos esta concepção com uma árvore cujas raízes naturalmente arraigadas ao solo aprofundam dando estabilidade à árvore. Há também os galhos, que sustentam a copa, se desenvolvem em ar livre, ramificam-se livremente e podem ser podados quando necessário. Semelhantemente, devemos pensar em uma estrutura de pensamento vinculada a uma verdade sólida, em um axioma irrefutável e a partir dela criarmos uma estrutura “aérea” e dinâmica, sujeita ao crescimento livre e à poda se necessário. Uma parcela flexível, não-paradigmática, sujeita à crítica, móvel e aberta, uma esfera de resignificação.

Assim, impediremos uma credulidade sem reflexão e uma racionalidade cética, superando dualismos, como fé e razão, ortodoxia e pensamento livre, assim por diante. Enfim, teremos crentes que pensam e pensadores que crêem.

Pensando

O pensamento raramente aparece no discurso cristão da atualidade e quando abordado sempre está associado a um suposto perigo da racionalidade ou a divagações que conduzem ao pecado ou ainda o risco de perder a fé. Mas, raramente o pensamento é mencionado como um dom, uma graça comum disponibilizada para que o homem possa decodificar e interpretar o mundo e a natureza de seu criador.

Certamente são inegáveis os danos causados pela queda do homem e seu efeito sobre a racionalidade humana. O pensamento humano foi corrompido pelo pecado. Conseqüentemente seu sistema de crença está distorcido e sua intervenção na realidade também foi danificada. Estão presentes no mundo as evidências. Por exemplo, testemunhamos uma era de tecnologias avançadíssimas em capacidade, mas nunca tão agressivas à criação e ao ecossistema.

Mas não estaria na agenda de Deus a restauração de uma racionalidade integral? Não desejaria Ele restituir as estruturas do pensamento humano segundo o modelo que Ele planejou para seus filhos no Éden?

Descobri que muitas das mazelas do cristão moderno são advindas não do diabo, ou do feiticeiro, da "oração contrária", da maldição hereditária ou das crises emocionais, mas principalmente de sua mente, por um pensamento não renovado.

O cristão está sob influência de um reducionismo teológico, que insiste em limitar a ação de Deus a esferas restritas. Tratam-no com competência para administrar apenas a esfera espiritual e invisível. Ou quando não, arbitrariamente arrastam Deus (como se tal coisa fosse possível) à condição de "gênio da lâmpada" para que Ele supra às necessidades pessoais de vivência consumista tão presente no mundo ocidental. Procuram colocar Deus como servo de seus ídolos. Lastimável!

Muitos, ainda adeptos deste falso conceito, excluem a razão e a cognição (pensamento) da soberania de Deus, como se a inteligência, a lógica, a criatividade e a filosofia fossem outras coisas. Colocam a razão como uma entidade autônoma ou, no mínimo, um dom estranho e descartável em questões de fé. Neste ponto, alguns cristãos ignoram que uma fé desprovida de reflexão é contra a natureza do próprio Criador, o qual sempre interagiu com os homens preservando-lhes a consciência.

Para os apóstolos, era óbvio o interesse de Deus sobre a razão, como assevera Paulo: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus" (Rm 12:2).

Discute-se pouco a batalha intelectual e o enfretamento que o homem, em processo de santificação, se depara continuamente. Isto é, revisão de conceitos e quebra de paradigmas de uma mente carnal não são debatidas, ao contrário, sataniza-se a realidade e transfere-se a responsabilidade, quando, na verdade, o que está envolvido é uma grande guerra de conceitos e significados.

As leis que norteiam uma mente caída precisam ser abolidas, dando lugar a uma nova estrutura de valores, como expresso pelo apóstolo: "vejo, nos meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente, me faz prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros" (Rm 7:23). Por questões óbvias, os velhos sistemas da mente humana estão aprisionados a um modelo de falsos dogmas. Sendo assim, instrumentalizada pela função pedagógica da lei de Deus, a educação dos sentidos tem papel fundamental em conduzir o discípulo à plenitude do homem perfeito - os atributos máximos de Deus manifestos em um homem - JESUS.

Vivemos cercados de falsas leis-credo: a lei do mercado, a lei da moda, a lei do consumo, a lei da violência, a lei da ambição, a lei dos homens. Mas temos por certo que a “lei é santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom" (Rm 7:12), que existem princípios normativos que sustentam uma ética divina, que me reeduca e me ensina a excelência. Isto é levar cativo todo pensamento a Cristo!

Agindo

Este é um aspecto que vem sendo ignorado pela grande maioria dos seguidores de Jesus. Parece simples, mas não é. A distorção do dogma reformado sola gracia trouxe conseqüências perturbadoras, dentre elas a anomia e conseqüentemente a dispensabilidade da ação. De fato, a salvação é um ato gracioso do Criador e não poderia ser de outra forma. Porém, uma percepção míope persiste e tem colocado os salvos em condição de inércia e passividade.

Impressiona-me a herança do idealismo grego sobre a Igreja ocidental, que insiste desde a reforma (para não dizer antes) em estabelecer um sistema de credos, uma lista sistemática de dogmas, que ao invés de expor o desenvolvimento de uma revelação processual, volta ao erro de uma dogmática rígida. Interessante, que Jesus, em seu ministério, não se preocupou em elaborar um modus fidei (modo de crer), mas procurou demonstrar um modus vivendi. Isto significa, que ele apresentou uma espiritualidade profundamente radicada à vida, ao dia-dia e ao testemunho pessoal; um evangelho que dialogava com seu tempo e o influenciava, envolvido com as questões sociais e na demanda de renovação da visão de mundo.

Angustiante pensar quantas denominações existem em território "tupiniquim" por causa desta incessante necessidade de divergência teológica. Os dogmas dividem, os paradigmas quebram vínculos, mas quem pensa em viver a fé? Se nosso credo não nos conduz a uma ação sobre o mundo, o problema pode estar “no que cremos". Dizes tu que tens fé? “Vem com a tua fé, que eu venho com a minhas obras!” Já dizia o judeu-crente Tiago. Obviamente, o apóstolo de Jerusalém estava familiarizado com o sentido hebraico de fé (hb. emuná), que se traduz como fidelidade. Para ele, baseado no pensamento judaico, o que se crê e o que se faz, são duas faces desassociáveis da mesma moeda. Não há dualismos!

Talvez aí esteja o motivo porque um país com uma população crente de mais de 30% não tem respostas concretas para a violência, a desigualdade social, o analfabetismo, a carência de descobertas científicas. Óbvio que ela não "tempera" o mundo em que está inserida. Se os efeitos não são sentidos, devemos questionar: O que será que está de errado no modelo de Igreja que temos? Desejamos sair da mediocridade, da passividade irritante que nada faz e pouco testemunho opera?

Há anos que o evangelismo dos "apelos" mancha a história da Igreja. Há uma necessidade - capitalista - de quantificar o sucesso da Igreja. Será que a Igreja do I século, tão sofrida, tão perseguida e subversiva, era tão dependente das estatísticas assim? Será que quando Lucas mencionava os números dos que iam sendo acrescentados dia a dia, estava preocupado em mostrar apenas a quantidade? Ou não estaria dizendo que sacerdotes obedeciam a fé, que vários judeus criam e eram zelosos da lei (Atos 21) e gentios piedosos davam esmolas (como Cornélio), que, além da quantidade, havia uma Igreja que se qualificava? Certamente, ele não estava preocupado em responder aos apelos modernos de um sucesso numérico, mas a uma demanda existencial, de pessoas que querem ardentemente a devolução de sua condição de Filhos de Deus. Sem dúvida, esta é uma necessidade de todos os tempos e lugares.

Enfim...

Temos que pensar nesta incrível tríade – crer-pensar-agir – do contrário, viveremos em uma nação que continuará refletindo a imagem e semelhança de nosso subdesenvolvimento espiritual. Nossas obras têm função missionária, elas anunciam aos povos o Reino de Deus, anunciam às nações o Messias que venceu a morte. Nosso comportamento é determinante para a evangelização. Muito mais importante, do que panfletos, rádios e megafones; muito mais importante do que um kerygma que não condiz com a vivência.

Desafio os crentes a pregarem o evangelho de forma alternativa. Quem estaria disposto a pregar Jesus através da ética, da generosidade, da retidão moral, do compromisso em pagar as contas em dia, da educação, da inteligência, da pontualidade, da competência profissional, acadêmica e científica?

Por isso disse o emissário aos gentios:

Vós, sois a nossa carta, escrita em nosso coração, conhecida e lida por todos os homens, estando já manifestos como carta de Messias, produzida pelo nosso ministério, escrita não com tinta, mas pelo Espírito do Deus vivente, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, nos corações (II Co 3:2-3).

Que nossa vida possa ser lida, interpretada, desvendada, para que mais pessoas sejam alcançadas para o Reino, discipuladas para também se tornarem agentes da história e não seus servos; senhores do tempo e não seus súditos, cumpridores do mandato cultural.

9 de ago. de 2007 | By: @igorpensar

SUJEITO, SUI GENERIS

Sujeito, senhor de si.
Sujeite-se! Sugere à sujeira.
Súdito, agente de si.
Ageite, agite sim!
Sui generis, súbdito subjetivo.
Enfim, é gente do seu jeito, assim.
Autor: Igor Miguel